segunda-feira, 19 de abril de 2010

Ser clichê é...


Clichê é amar e ser amado...

Clichê é amar e não ser amado....

É gostar de chocolate, sorvete....

É andar na praia descalço,

Chorar por um amor desfeito....

Clichê é colar na prova de matemática,

Gostar de Shakespeare, Drummond...

É odiar ônibus lotado, achar todo BB lindo...

Ser clichê é ter um grande amor aos 15 anos,

Gostar de Renato Russo, achar a lua linda numa noite de verão...

Ser clichê é ter medo de bicho papão, de escuro, da loira do banheiro...

É torcer pro Brasil em copa do mundo...

É ver novela das 8, ir na igreja só em dia de casamento, batizado ou natal...

É falar inglês, gostar de coca-cola,

Clichê é querer ter lua de mel em Paris....

Gostar de Almodóvar, das canções do Roberto....

Ser clichês é ter coragem de olhar nos olhar,

Sentir saudade...

Ser clichê é estar no mundo e admitir que a vida, em toda a sua plenitude, é a coisa mais simples que existe....

De amor e jingles: eu vivo sempre no mundo da lua....



Era o mote principal da peça, mote capaz de aliviar os medos e oferecer o que há de mais ingênuo: os sonhos... Assim foi a caminhada de Ignácio e o famigerado "Vô".


Momento Grease...De amor e jingles


Como é bom ver filmes na sessão da tarde...Olha, que filme legal está passando na TV...

I Flit: De amor e jingles


I Flit- 2008

O I FLit foi uma ambiciosa tentativa de se resgatar a arte e sua tradição há muito esquecidas no Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo. O processo foi duro, doloroso, inseguro, mas o resultado superou as expectativas e me ajudou a acreditar em meu próprio texto. De amor e jingles foi um musical nascido na fila de um banco- misturou toda a linguagem que tanto fez parte da minha formação: tv, cinema, jingles.... É um texto melancólico, repleto de passado e saudade. Fala de um garoto, que num sótão empoeirado, encontra as lembranças do velho avô e a partir delas, parte para uma viagem surreal.


Dramaturgo autodidata

Dramaturgo autodidata me arrisco em escrever alguns textos para o Flit ( Festival de Literatura e Teatro do Liceu). Ainda tenho muito que aprender na arte de Shakespeare, mas qualquer tentativa de se fazer Arte e Cultura na escola vale muito a pena....

domingo, 18 de abril de 2010

Mon Proust

"Une heure n'est pas qu'une heure, c'est un vase rempli de parfums, de sons, de projets et de climats". (Proust, Le Temps retrouvé).

Fim de relação


-Só sei que eu não tenho mais nada para lhe dizer agora, é isso, acabou e ponto final....
-Como assim acabou e ponto final?? Acha que é assim... E todas aquelas palavras que foram ditas....
-Palavras ao léu, ao vento, entende? O tempo passou minha cara, nos não somos os mesmos. Você mudou, eu mudei... Sabe, não consigo mais olhar para você, teu jeito me irrita, teu tom de voz me irrita, teu olhar me irrita....
-Antes você gostava do meu olhar, dizia que era tenro, puro....
-Antes, hoje não..... hoje esse tom de quem está sempre buscando algo, precisando de algo, clamando por algo me deixa, me deixa, me deixa, digamos, profundamente irritado....
-Você também me irrita....
- Sério, tá vendo, então... estou lhe fazendo um favor: cada um segue o seu caminho e pronto, todo mundo fica feliz....
-Calma lá, não é tão simples assim... você me irrita, mas vou sentir falta da tua irritação....

-Ahahahahahaahaahaha! Só você mesmo, você não existe, esse seu dom para o sofrimento me deixa profundamente pungido... louca!!! Mas me diga lá, o que eu faço que te irrito, sou o cara ideal: atencioso, bonito, sexual, enfim, um ótimo partido para qualquer mulher....
- hahahahaha!!! Hum, bom, deixe me pensar.... O jeito que você dorme roncando não é nada romântico...Quando você chega do trabalho, tira o sapato e deixa tudo jogado é profundamente irritante . Odeio ter que sair pela casa pegando suas meias, suas roupas, isso sem contar as cuecas sujas. Outra coisa: você assistindo futebol também me irrita, aliás, isso deve irritar qualquer mulher.... sem contar a cervejinha, os arrotos, a saidinha com os amigos.. Ah, teus amigos são bem irritantes, porque Baudelaire, porque Platao, porque a filosofia dialética e metafísica....
-La vem você com esses preconceitos idiotas, gosto de futebol sim e daí.... e meus amigos têm conteúdo, já os seus... Nem preciso falar dos boiolinhas malhados e das professorinhas,, ridículas... ... Ah, vc fala de mim, odeio os teus CDs sertanejos... ninguém merece ficar ouvindo aquela ladainha brega o sábado inteiro..agora que estou te deixando, posso dizer, acordar na tua casa sábado de manhã e ser obrigado a escutar aqueles CDs horrorosos que você coloca, vou te contar hein....
- e você que gosta de novela?
-epa, epa, epa, novela é Cult...
- risos, Cult, deculpa aí, esqueci que tudo que você gosta é Cult... Meu, como uma pessoa pode gostar de novela e filme velho... Aproveitando o ensejo digo que odeio ir ao cinema com você e ficar vendo aqueles filmes iranianos chatissimos repletos de criancinha e guerras, odeio, odeio, odeio...
- Eu achei que você gostava...... é assim, já que é para ser sincero: detesto tua família, detesto teus sobrinhos, aqueles animais, odeio teu pai, teus irmãos são folgados e vagabundos e a comida da sua mãe é horrível....
- mas você dizia que adorava o macarrão dela.....
- pois bem, era tudo mentira.... que sofrimento ir quase todo domingo para lá e ver aquela família bizarra reunida.....
- Pelo menos não são castradores como a psicopata da sua mãe.....
- ok, ok... já que somos tão diferentes, não sei porque você está tão relutante em terminar nossa relação, não era você que sempre dizia que nunca estava preparada para o amor, que nunca ia conseguir se ater a alguém, se dedicar....
-É mesmo!!!!!! É, você foi sempre romântico né?? lembro que no inicio do nosso namoro, você ficou se rastejando para mim, lembra de quantas flores você me mandou, meu Deus, e eu sou alérgica a flores, quase morri com as dúzias de rosas vermelhas que não paravam de chegar... e vou te contar hein, rosas, que coisinha brega....
-Hum, fique sabendo que muitas mulheres dariam a vida para receber rosas minhas....
-É! Valeu mais pela atitude... Você me venceu pela insistência e quando eu percebi, estava ali, presa a você, atada, te querendo cada vez mais...
-Eu te amei muito.... você era como algo precioso que eu sempre desejava, que eu sempre buscava.... mas passou, como tudo na vida... e onde chegamos hein? As coisas se inverteram, agora eu quero terminar, preciso terminar com essa relação, ela está me fazendo mal...
-Como te fazendo mal, sou a mulher perfeita: inteligente, linda, nosso sexo sempre foi bom...
-Hum, realmente, o sexo sempre foi bom....
-Então, porque você quer terminar com algo tão, tão perfeito...
-Pêra ai, perfeito não, se fosse perfeito, eu não terminaria......
-Típico de filosofo né, nunca está satisfeito com nada.
-Eu só queria mudar, nossa vida, o dia a dia sabe, mais se parece com uma lista telefônica, entendiada, voce não me surpreende mais...
-Eu??!No inicio da relação você dizia que odiava ser surpreendido e agora essa reclamação...homens, definitivamente eu não os entendo.... acho que você tem razão, é melhor terminarmos com isso logo...
-Mas porque voce está falando isso, não gosta mais de mim?
-Depois de tudo que você me disse, estou pensando...
-Como assim? Não gosta de mim mesmo? Me diga... agora é você quer terminar com nossa relação, ela sempre foi boa...
-Eu sei que foi, mas você me levou a pensar, somos bem diferentes, entende? I N C O M P A T I BI LIDADE EMOCIONAL
-Não concordo, sempre que você precisou eu estava lá, se uma coisa que eu nunca fui na vida foi egoísta...
-Não estou falando de egoísmo, sei lá, não tô te amando mais
-Como assim? Antes voce me amava. Agora mesmo, acabou de dizer que me amava....
-Mas agora não mais, é isso, o melhor que temos a fazer é nos separar... deveria ter escutado minha astróloga, capricórnio com leoninos não dão certo. Sou teimosa e você se acha....
-Pára, pára, agora quem não quer terminar a relação sou eu.. onde já se viu, nem pensar, fui um bom namorado, um companheiro fiel....
-Fiel? Ahahah, me poupe
-Do que está rindo....
-Fiel voce? Acha que sou otária, sei de todos os seus pulos...
-Pulos, eu? Você tá louca...... nunca te traí
-Realmente.. pensa que não sei das suas reuniõezinhas no fim do dia.....
-Realmente... você é neurótica, nunca te traí, acho que você tem razão, é melhor a gente se separar mesmo...
-Ahahahaha, quem cala consente, por isso você quer se separar então..... para ter liberdade, não, não, não, agora quem não quer se separar sou eu.... vai ter que me aturar.... vai sim.....Não vou terminar com voce para logo cair nos braços da primeira desfrutável da rua, não mesmo....
-Olha, não te entendo, não te entendo mesmo.....
-Melhor não entender....
-Mulher é tudo igual....
-Homem é tudo igual...
-Façamos assim, ficamos mais um tempo e se não rolar, a gente se separa... ok?
-Hum, ok.... a gente tenta, mas se não der certo.. . Enquanto isso, trata de recolher essas meias, você é muito desorganizado, ninguém merece........
- tudo bem, eu recolho, mas antes, que tal a gente dar uns beijinhos
-Hum, gostei da idéia.....
- E a noite vamos a estréia do novo filme do Godard, depois a gente sai com a galera......
- ok, ok, mas amanha temos almoço lá em casa, meu pai ta fazendo aniversário e minha mãe vai fazer aquele macarrão que todos adoram....
- Hum, fiquei com uma fome agora....
-Ahahaha é!!! fome de quê
- fome de voce!!! Vem amor, dá aqui umas bitoquinhas, dá....

Desejo...

Ânsia de ser assim- uma pessoa comum, repleta de sonhos, de desejos... Desejo de andar na areia, pensando na vida, pensando naquilo que passou... Desejo de reconhecer essa inocência anônima, esse asco que me penetra alma adentro e que fica lá, preso, feito um bicho estranho. Bicho estranho que sou eu mesmo, senhor de mim, senhor das minhas atitudes, senhor dos meus sonhos frustrados, inacabados. Sensação eterna de estar pela metade. Metade amor, metade sexo, metade alegria, metade literatura, metade cinema, metade poesia.... Prisão eterna, devaneio constante... E como é bom viver de devaneios, como é bom pensar que não há escolhas e o que há é apenas o que há para se ter... A vida é assim mesmo, um eterno folhetim barato, um musical inacabado, uma tosca comédia romântica dos anos 30, dessas que arrancam lagrimas e sorrisos ao mesmo tempo. Hoje quero ser eu mesmo, quero ser Clarice e sua profunda desgraça de ser o que é, quero ser Caio e sua mais cortante angustia trágica, quero ser alguém que não segue o rebanho, quero ser alguém original, será que tentar ser feliz me torna original? Se é possível, alguém aí cima, por favor, me deixe ser feliz....

Ser-tão

Ser-tão triste
Ser-tão feliz
Ser-tão-só
Ser-tão repleto de gente ao meu redor
Ser-tão contráditorio
Ser-tão plano
Ser-tão inseguro
Ser-tão confiante dos outros
Ser-tão amado
Ser-tão desamado
Ser-tao perdido nesse mundo grande
Ser-tão eu mesmo
nesse sertão roseano de ser

A última viagem de bonde...

Para Simone...




Já se acostumara ao caminho do bonde, tantas vezes da Mooca ao Bresser, o vagão lotado, as pessoas sorrindo, outras tristes....Pena que aquela seria a ultima viagem do bonde. Soubera nos jornais, que o governo tinha uma nova proposta de modernização das cidades. Achava ruim a modernização, "onde já se viu, tirar o bonde, patrimônio cultural...."

Aproveitava aquela ultima viagem como um deleite. Há quase cinco anos, desde o fim do curso normal lecionava em um grupo escolar e para ir trabalhar, pegava aquele trajeto todos os dias.
Todas as manhãs, esperava pelo bonde, e nele, ia cantando, refletindo e lendo. Ultimamente tinha descoberto Clarice Lispector e quase enlouquecera: “Meu Deus, uma mulher escreve dessa maneira?!!”. Sentia uma verdadeira felicidade clandestina ao ler todas aquelas palavras que torturavam e mergulhavam na alma. Naquele dia, em sua última viagem de bonde, lia Uma aprendizagem ou o livro dos Prazeres. Será que alguém pode ensinar ao outro a ter prazer?. “Pode sim, pensava”, afinal, Lori aprendia com Ulisses que a vida pode ser prazerosa e dolorosa, que em alguns momentos de nossas vidas, fingimos que amamos e que somos amados... Naquele dia, em meio ao deslizar lento do bonde sobre os trilhos, ela se deliciava com Ulisses e refletia sobre o que é o amar. Ela, que até então, nunca tinha sido amada, ela que não fazia a minima ideia do que era o amor, o pulsar do coração, o olhar tenro, a garganta seca...Só conhecia o amor dos livros: o poemas tristes de Camões cantando um amor dilacerado, a tranquilidade dos versos de Dirceu e sua Marília, ou o martirio do amor De Julieta e Romeu, amor universal, amor, sinônimo do sofrer e de um pesar quase irmanados.

Quase no ponto final, depois de passar por mais uma estação, percebeu que estava sozinha no bonde. Coincidência, uma viagem só para ela...Foi quando, como num conto de fadas barato, ou num desses poemas de Baudelaire, surge um desconhecido. Alguém que nunca vira antes, estranho, olhos garços, sorriso sutil. O olhar sobre ela foi de um efeito indescritível. Tantos lugares para se sentar e ele foi ter justamente ao seu lado. Receosa, tremendo, com o livro nas mãos, podia escutar o retumbar do coração que agora insistia em palpitar aceleradamente. "O que é isso meu Deus, porque estou me sentindo assim"...Sentimento estranho, que anestesia e envaidece.

Sem querer, seus lábios retribuíram o olhar tenro do rapaz. Agora ela estava ali, perdida, ao lado de um estranho, naquela ultima viagem de bonde, do seu bonde...
Sem perceber, sem dizer nada, sem falar, o rapaz pegou-lhe nas mãos e o toque de seus lábios nos pequenos dedos habituados ao giz, a fez sussurrar por dentro.

A viagem finalmente chegara ao fim, “não, meu Deus, essa viagem não pode terminar nunca!!!”. O rapaz sorriu, se levantou, tomou um bloquinho de notas, escreveu no bilhete e lhe entregou. Na parada, um último sorrir e o acenar das mãos que desaparecia à medida que o bonde se distanciava. Com ela, um sentimento de tristeza e felicidade roubada.
"Será esse o amor da minha vida?" Com o bilhetinho suado nas mãos, abriu-o como se toca algo precioso. Ao lê-lo, um sentimento de desespero, de perda, de modernidade: “te encontro amanha no mesmo bonde, na mesma hora”.... "Como assim? Essa é a ultima viagem do bonde, amanha não terá outra, como encontrá-lo, como tê-lo novamente". O bonde chegou ao seu destino, ela finalmente desceu, ainda anestesiada pelos sentimentos e pela nova pessoa que se fez num curto instante de sensações. "Amanha não terá mais bonde, só ônibus, a modernidade tirara talvez algo que eu nao sei o que é".
A partir daí e nos dias que se passaram, nada mais de leitura, nada mais de Clarice, só o contemplar de dentro do ônibus, os vários pontos que vinham e passavam diante dos seus olhos angustiados a espera daquele olhar.O que se tinha apenas eram as pessoas que entravam e saíam do onibus contemplando felizes a modernidade da cidade que, aos poucos, ia nascendo em meio aos trilhos perdidos daquele bonde que se fora...